segunda-feira, 12 de maio de 2014

Entrevista Janet Balaskas - Ativista parto Natural - Revista Crescer

Janet Balaskas explica sobre parto ativo e fala das cesáreas no Brasil

Ativista que luta para disseminar informações sobre parto natural fala com a CRESCER sobre o tema

Por Maria Clara Vieira - atualizada em 12/05/2014 13h08
janet_balaskas_parto_ativo (Foto: divulgação)
Em uma visita de quase um mês pelo Brasil, a ativista Janet Balaskas realizou workshops sobre parto e concedeu entrevista à CRESCER. Janet lidera o Movimento pelo Parto Ativo, fundado em Londres na década de 1980. Na época, mulheres inglesas protestavam pelo direito de se movimentar durante o trabalho de parto e poder escolher a posição em que dariam à luz. Desde então, o movimento se popularizou por todo o mundo. Sua principal bandeira é a ideia de que a mulher é uma participante ativa do parto e, como tal, deve ter suas escolhas respeitadas. Confira a entrevista na íntegra.
Janet Balaskas: Podemos resumir os inúmeros benefícios em: mais segurança, mais conforto e mais facilidade para a mulher dar à luz e para o bebê nascer. No Parto Ativo, a mulher segue seus instintos para encontrar as melhores posições. Ela trabalha a favor da força da gravidade, em vez de ir contra ela. Esta conduta ajuda a descida do bebê, o trabalho do útero e os esforços da mulher. Quando a mãe está relaxada ou se movimentando em posições verticais, seu corpo está em harmonia com a força da gravidade, e seu trabalho de parto é menos doloroso; há mais espaço na pélvis para acomodar o bebê; e o suprimento de oxigênio para ele é ótimo. Todos os fundamentos do Parto Ativo são baseados em evidências e pesquisas. No documento Manifesto pelo Parto Ativo, disponível no sitewww.partoativobrasil.com.br você encontra a explicação completa deste conceito e todas as pesquisas que o embasam.
C.: Em quais posições o trabalho de parto pode acontecer? Há alguma posição que não seja recomendada?
J.B.: A mulher pode passar seu trabalho de parto em qualquer posição que se sinta confortável, e talvez troque de posição de tempos em tempos. Se, durante a gestação, a mulher for informada sobre as diferentes posições que pode adotar, e, se ela tiver possibilidades de encontrar conforto nelas (por exemplo: colchonete no chão, uma bola suíça para sentar ou para se inclinar sobre, um banco de parto, almofadas), seu corpo irá conduzi-la para as posições que funcionam melhor para ela e para seu bebê. Geralmente, eu não recomendo ficar deitada de costas ou semi-reclinada – o que eu chamo de ‘posição obstétrica’, porque o espaço no interior da pélvis será reduzido, e pode também comprometer o fluxo de sangue para o útero e para o bebê. Também não haverá a ajuda da força da gravidade para a mãe, o bebê e o útero. Nesses casos, o trabalho de parto pode demorar mais e ser mais dolorido, além de aumentar o risco de estresse fetal. Entretanto, se a mãe prefere esta posição, devemos respeitá-la. Mas podemos convidá-la, com gentileza, a tentar deitar-se de lado, ou ajoelhar-se e apoiar seus braços e tronco numa bola suíça, por exemplo.
C.: De acordo com a ONU, o Brasil é o país com a maior taxa de cesáreas do mundo (44%), e apenas 15% dos nascimentos deveria ser por esta via. De acordo com a sua experiência, o que levou o país a um número tão alto de cesarianas desnecessárias?
J.B.: Na verdade, eu acredito que a taxa de cesarianas no Brasil é muito maior que isto, subindo em torno de 2% ao ano e se aproximando agora de 60%. É a maior taxa do mundo. É uma situação muito séria, e muitas pessoas já estão preocupadas com esta questão. O movimento pelo parto natural está crescendo rápido agora, tanto no Brasil quanto em outros países. As cesarianas desnecessárias acontecem por uma série de razões, como conveniência, medo de ser processado (por parte dos médicos), medo do parto normal (por parte das mulheres), falta de conhecimento sobre a fisiologia do parto por parte dos médicos e dos pais que não entendem os grandes benefícios de um parto natural como, por exemplo, em relação à segurança e à saúde física e mental. Ademais, é preciso mencionar que a cirurgia cesariana é mais lucrativa que um parto natural, e que um obstetra ganhará muito mais dinheiro fazendo em torno de 7 cesarianas num único dia do que atendendo um parto normal – que pode ser lento e demorado. Isto acontece porque os planos de saúde no Brasil pagam os médicos por cada nascimento. Se as obstetrizes e as enfermeiras obstetras fossem as principais profissionais a atender partos normais (como acontece no Reino Unido), os médicos poderiam estar focados apenas nos casos complicados. Então, muitas mudanças precisam acontecer. Acredito que a preparação com Parto Ativo durante a gestação pode ser uma caminho poderoso para reduzir as taxas de cesariana. Estamos começando o Movimento pelo Parto Ativo aqui no Brasil, e já formamos o Instituto Parto Ativo Brasil.
C.: Muitas mulheres têm medo da dor do parto. Como o fator psicológico influencia o sucesso do parto natural?
J.B.: Esta é uma questão importante e ampla. O corpo da mulher produz um fantástico “coquetel” de hormônios durante o trabalho de parto. Este “coquetel” foi criado pela natureza para tornar o trabalho de parto e o parto em si mais confortável e menos dolorido. Entretanto, eles são sensíveis ao ambiente. Quando a mulher se sente segura, relaxada, tem privacidade, e não há ninguém atrapalhando ou observando, então seus níveis hormonais atingem níveis ótimos e ela pode transcender a dor. Nossa própria produção natural para alívio da dor garante que consigamos lidar com ela. Sempre explico isto às mulheres, e as ajudo a confiarem em seus corpos e a ter expectativas positivas ao invés de negativas.
C.: Quais atividades ou exercícios podem ajudar as mulheres a se prepararem para o parto natural?
J.B.: A boa preparação é de grande valia para as mulheres que sentem medo, especialmente boas aulas de ioga para gestantes, ou um workshop de Parto Ativo. Creio que ioga, respiração, meditação e relaxamento são os exercícios mais eficazes. Natação e caminhadas são também boas maneiras de manter a saúde, e são exercícios que podem ser feitos de forma suave.
C.: Qual é o papel do pai durante o trabalho de parto? Como ele pode ajudar a mulher?
J.B.: 
Acredito que o pai pode ajudá-la de muitas formas, mas ele também precisar estar informado e preparado, e se sentir relaxado e tranquilo para estar lá. Se o pai é muito ansioso, talvez seja melhor que ele não acompanhe o parto. Os pais podem ajudar fazendo massagem, mantendo contato corporal com a mulher nas diferentes posições, se é isto que ela precisa. Ele também fala por ela, ajuda a comunicar suas necessidades e desejos, se for necessário.
C.: Em 1982, você reuniu aproximadamente 6 mil pessoas em uma passeata em Londres para protestar contra os cuidados obstétricos que as mulheres recebiam no país. O que a motivou? Que tipo de violência obstétrica era comum na Inglaterra naquela época?
J.B.:
 A violência obstétrica na época era forçar as mulheres a ficarem deitadas de costas, e negar a elas o direito e a liberdade de se movimentarem. Havia também uma tendência de conduzir todas as mulheres para grandes hospitais, e adotar uma abordagem extremamente medicalizada chamada de “Manejo Ativo do Trabalho de Parto”. Estavam incluídos aí indução eletiva do trabalho de parto, uso de monitoramento fetal eletrônico, anestesia peridural e outros medicamentos para alívio da dor. Esta situação era muito ruim para as mulheres. Tirava todo o seu poder e seu controle sobre seus próprios corpos e seus partos.
C.: Quando olha para trás, você percebe, hoje, mudanças significativas na violência obstétrica na Europa?
J.B.:
 O Parto Ativo se transformou em um termo genérico usado em todo o mundo, e você só precisa assistir a vídeos de parto na internet para verificar como as posições verticais são comuns atualmente. Na Europa, em geral, os direitos e opções das mulheres sobre parto são mais respeitados. O parto domiciliar planejado é oferecido gratuitamente pelo governo de vários países – inclusive o Reino Unido – e os hospitais e centros para parto normal costumam ter piscinas de parto, bolas, privacidade e tranquilidade. Entretanto, este é apenas o começo desta revolução, pois leva tempo para mudar uma cultura.
C.: Você já sofreu violência obstétrica?
J.B.:
 Apenas uma vez. No meu primeiro parto foi feita uma episiotomia contra a minha vontade. Eu não precisava e me senti violada nos últimos minutos do que poderia ter sido um maravilhoso parto natural. Mas posso agradecer esta experiência por ter me conduzido para onde estou hoje. Meus outros filhos nasceram em casa, tendo apenas uma obstetriz na assistência – com exceção do meu último filho, em que fui atendida pelo obstetra Michel Odent na minha casa – mas sua conduta foi estritamente a de uma obstetriz.
Fonte: Revista Crescer globo.com

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