A Dra. Melania Amorim, obstetra, professora da
Universidade Federal de Campina Grande, e dona de um "Curriculo Lattes" admirável, há alguns anos vem
alimentando uma lista de indicações reais e fictícias para a cesareana. Eu
descobri que as duas cesáreas que eu tive foram desnecessárias, e assim como
outras, as indicações também estão aí na lista. Vale a pena conferir.
Por Melania Amorim, MD, PhD
A presente lista de indicações de cesariana circula na Internet desde
2005, quando eu publiquei a primeira versão em uma comunidade do Orkut (“Cesárea?
Não, obrigada!”), e desde então tem sido amplamente divulgada, crescendo
lamentavelmente a cada dia, porque estou sempre me deparando com gestantes
querendo esclarecimentos ou mulheres que contam suas próprias histórias ou
histórias de amigas.
Recentemente, Ana Cristina Duarte,
obstetriz e amiga, fez alguns acréscimos e organizou a lista em ordem
alfabética, motivo pelo qual lhe dou os créditos da presente versão. É de
domínio público, usem à vontade, mas preferentemente remetendo à fonte, ou
seja, Amorim & Duarte (2012), com link para esta página da Web.
Não temos a pretensão de cobrir todas
as possíveis indicações de cesariana, apenas começamos a elencar sobretudo as
“não indicações” mais frequentes.
Para uma leitura mais aprofundada e
baseada em evidências, eu recomendo a série de artigos que publicamos na
revista Femina, “Indicações de Cesariana Baseadas em Evidências”, em três
partes:
Parte 1 Indicações de Cesariana Baseadas em Evidências – Parte 1
Parte 2 Indicações de Cesariana Baseadas em Evidências – Parte 2
Parte 3 Condições frequentemente associadas à Cesariana sem respaldo científico
Segue a lista (em constante
atualização):
INDICAÇÕES REAIS E FICTÍCIAS PARA A CESÁREA
Algumas indicações de cesariana REAIS
1) Prolapso de cordão – com dilatação
não completa;
2) Descolamento prematuro da placenta
com feto vivo – fora do período expulsivo;
3) Placenta prévia parcial ou total
(total ou centro-parcial);
4) Apresentação córmica (situação
transversa) – durante o trabalho de parto (antes pode ser tentada a versão);
5) Ruptura de vasa praevia;
6) Herpes genital com lesão ativa no
momento em que se inicia o trabalho de parto.
PODEM ACONTECER, PORÉM FREQUENTEMENTE SÃO DIAGNOSTICADAS DE FORMA
EQUIVOCADA
1) Desproporção cefalopélvica (o
diagnóstico só é possível intraparto, através de partograma e não pode ser
antecipado durante a gravidez);
2) Sofrimento fetal agudo (o termo mais
correto atualmente é “freqüência cardíaca fetal não-tranqüilizadora”,
exatamente para evitar diagnósticos equivocados baseados tão-somente em padrões
anômalos de freqüência cardíaca fetal);
3) Parada de progressão que não resolve
com as medidas habituais (correção da hipoatividade uterina, amniotomia),
ultrapassando a linha de ação do partograma.
SITUAÇÕES ESPECIAIS EM QUE A CONDUTA DEVE SER INDIVIDUALIZADA,
CONSIDERANDO-SE AS PECULIARIDADES DE CADA CASO E AS EXPECTATIVAS DA GESTANTE,
APÓS INFORMAÇÃO
1) Apresentação pélvica (recomenda-se a
versão cefálica externa com 37 semanas mas se não for bem sucedida, discutir
riscos e benefícios com as gestantes: o parto pélvico só deve ser tentado com
equipe experiente e se for essa a decisão da gestante);
2) Duas ou mais cesáreas anteriores (o
risco potencial de uma ruptura uterina – variando de 0,5% – 1% – deve ser
pesado contra os riscos de se repetir a cesariana, que variam desde lesão
vesical até hemorragia, infecção e maior chance de histerectomia);
3) HIV-AIDS (cesariana eletiva indicada
se HIV + com contagem de CD4 baixa ou desconhecida e/ou carga viral acima de
1.000 cópias ou desconhecida); em franco trabalho de parto e na presença de
ruptura de membranas, individualizar casos.
Algumas desculpas frequentemente utilizadas pelos profissionais para
realizar uma DESNEcesárea (em ordem alfabética)
1. Abdominoplastia
prévia
|
2. Aceleração
dos batimentos fetais
|
3. Adolescência
|
4. Ameaça
de chuva/temporal na cidade
|
5. Anemia
falciforme
|
6. Anemia
ferropriva
|
7. Anencefalia
|
8. Artéria
umbilical única
|
9. Asma
|
10. Assalto
ou outras formas de violência (gestante ou familiar foi vítima de assalto,
então o bebê pode ficar estressado)
|
11. Bacia
“muito estreita”
|
12. Baixa
estatura materna
|
13. Baixo
ganho ponderal materno/mãe de baixo peso
|
14. Bebê
alto, não encaixado antes do início do trabalho de parto
|
15. Bebê
profundamente encaixado
|
16. Bebê
que não encaixa antes do trabalho de parto
|
17. Bebê
“grande demais” (macrossomia fetal só é diagnosticada se o peso é maior ou
igual que 4kg e não indica cesariana, salvo nos casos de diabetes materno com
estimativa de peso fetal maior que 4,5kg. Não se justifica ultrassonografia a
termo em gestantes de baixo risco para avaliação do peso fetal).
|
18. Bebê
“pequeno demais”
|
19. Bolsa
rota (o limite de horas é variável, para vários obstetras basta NÃO estar em
trabalho de parto quando a bolsa rompe)
|
20. Calcificação
da sínfise púbica (alegando-se que ocorreria em TODAS as mulheres com mais de
35 anos, impedindo o parto normal)
|
21. Cardiopatia
(o melhor parto para a maioria das cardiopatas é o vaginal)
|
22. Cesárea
anterior
|
23. Chlamydia,
ureaplasma e mycoplasma
|
24. Circular
de cordão, uma, duas ou três “voltas” (campeoníssima – essa conta com a
cumplicidade dos ultrassonografistas e o diagnóstico do número de voltas é
absolutamente nebuloso)
|
25. Cirurgia
gastrointestinal prévia
|
26. Colestase
gravídica
|
27. Coleta
de sangue do cordão umbilical para congelamento e preservação de
células-tronco
|
28. Colo
grosso, colo posterior, colo duro, colo alto e (paradoxalmente) colo
curto
|
29. Colostomia
|
30. Conização
prévia do colo uterino
|
31. Constipação
(prisão de ventre)
|
32. Cálculo
renal
|
33. Data
provável do parto (DPP) próximo a feriados prolongados e datas festivas
(incluindo aniversário do obstetra)
|
34. Datas
significativas como 11/11/11 ou 12/12/12 (ainda bem que a partir de 2013
precisaremos esperar o próximo século)
|
35. Diabetes mellitus clínico
ou gestacional
|
36. Diagnóstico
de desproporção cefalopélvica sem sequer a gestante ter entrado em trabalho
de parto e antes da dilatação de 8 a 10 cm
|
37. Dorso
à direita, dorso posterior, ou dorso em qualquer outro lugar
|
38. Edema
de membros inferiores/edema generalizado
|
39. Eletrocauterização
prévia do colo uterino
|
40. Endometriose
em qualquer grau e localização
|
41. Epilepsia
e uso de qualquer droga antiepiléptica
|
42. Escoliose
|
43. Espondilite
anquilosante – Qualquer espondiloartropatia
|
44. Estreptococo
do Grupo B (EGB) no rastreamento com cultura anovaginal entre 35-37 semanas
|
45. Exérese
prévia de pólipos intestinais por colonoscopia
|
46. Falta
de dilatação antes do trabalho de parto
|
47. Feto
com “unhas compridas”
|
48. Feto
morto
|
49. Fibromialgia
|
50. Fratura
de cóccix em algum momento da vida
|
51. Gastroplastia
prévia (parece que, em relação ao peso materno, se correr o bicho pega, se
ficar o bicho come)
|
52. Gestação
gemelar com os dois conceptos, ou o primeiro, em apresentação cefálica
|
53. Gravidez
não desejada
|
54. Grumos
no líquido amniótico
|
55. HPV
(só há indicação de cesárea se há grandes condilomas obstruindo o canal de
parto)
|
56. Hemorroidas
|
57. Hepatite
B e hepatite C
|
58. Hiperprolactinemia
|
59. Hipertireoidismo
|
60. Hipotireoidismo
|
61. História
de cesárea na família
|
62. História
de câncer de mama ou câncer de mama na gravidez
|
63. História
de depressão pós-parto
|
64. História
de natimorto ou óbito neonatal em gravidez anterior
|
65. História
de trombose venosa profunda
|
66. História
familiar de fibrose cística do pâncreas
|
67. Idade
materna “avançada” (limites bastante variáveis, pelo que tenho observado, mas
em geral refere-se às mulheres com mais de 35 anos)
|
68. Incisura
nas artérias uterinas (pesquisada inutilmente, uma vez que não se deve
realizar dopplervelocimetria em uma gravidez normal)
|
69. Infecção
urinária
|
70. Inseminação
artificial, FIV, qualquer procedimento de fertilização assistida (pela ideia
de que bebês “superdesejados” teriam melhor prognóstico com a cesárea) –
motivo pelo qual esses bebês aqui no Brasil muito raramente nascem de parto
normal
|
71. Insuficiência
istmocervical (paradoxalmente, mulheres que têm partos muito fáceis são
submetidas a cesarianas eletivas com 37 semanas SEM retirada dos pontos da
circlagem)
|
72. Laparotomia
prévia
|
73. Líquido
amniótico em excesso
|
74. Magreza
da mãe
|
75. Malformação
cardíaca fetal
|
76. Mecônio
no líquido amniótico (só indica cesariana se houver associação com padrões
anômalos de frequência cardíaca fetal, sugerindo sofrimento fetal)
|
77. Mioma
uterino (exceto se funcionar como tumor prévio)
|
78. Miscigenação
racial (pelo “elevado risco” de desproporção céfalo-pélvica)
|
79. Neoplasia
intraepitelial cervical (NIC)
|
80. Obesidade
materna
|
81. Obstetra
(famoso) não sai de casa à noite devido aos riscos da violência urbana
|
82. Paciente
“não tem perfil para parto normal”
|
83. Parto
“prolongado” ou período expulsivo “prolongado” (também os limites são muito
imprecisos, dependendo da pressa do obstetra). O diagnóstico deve se apoiar
no partograma. O próprio ACOG só reconhece período expulsivo prolongado mais
de duas horas em primíparas e uma hora em multíparas sem analgesia ou mais de
três horas em primíparas e duas horas em multíparas com analgesia. Na curva
de Zhang o percentil 95 é de 3,6 horas para primíparas e 2,8 horas para
multíparas)
|
84. “Passou
do tempo” (diagnóstico bastante impreciso que envolve aparentemente qualquer
idade gestacional a partir de 39 semanas)
|
85. Placenta
grau III ou II ou I ou qualquer outra classificação
|
86. Plaquetas
baixas não oclusivas do colo do útero
|
87. Possível
falta de vaga em maternidade para um parto normal, caso a gestante não marque
a cesárea
|
88. Pouco
líquido no exame ultrassonográfico (sem indicação no final da gravidez em
gestantes normais)
|
89. Praticar
musculação ou ser atleta
|
90. Pressão
alta
|
91. Pressão
baixa
|
92. Problemas
oftalmológicos, incluindo miopia, grande miopia e descolamento da retina
|
93. Prolapso
de valva mitral
|
94. Qualquer
malformação fetal incompatível com a vida
|
95. Qualquer
procedimento cirúrgico durante a gravidez
|
96. Reação
vasovagal
|
97. Sedentarismo
|
98. Septo
uterino/cirurgia prévia para ressecção de septo por via histeroscópica
|
99. Ser
bailarina
|
100. Suspeita
ecográfica de mecônio no líquido amniótico
|
101. Síndrome
de Down e qualquer outra cromossomopatia
|
102. Síndrome
de Ovários Policísticos (SOP)
|
103. Tabagismo
|
104. Trabalho
de parto prematuro
|
105. Trombofilias
|
106. Varizes
uterinas
|
107. Uso
de antidepressivos ou antipsicóticos
|
108. Uso
de heparina de baixo peso molecular ou de heparina não fracionada
|
109. Útero
bicorno
|
110. Varizes
na vulva e/ou vagina
|
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